segunda-feira, 1 de julho de 2013

A RUA ENSINA

O repórter de rua, digo, aquele que realmente vai cobrir matérias em bairros, por exemplo, se depara com importantíssimas lições. Se bem observado, pode-se fazer uma especialização em política social, sociologia e teologia, só para citar as ciências humanas mais próximas do dia-a-dia. 
Hoje foi dia de me pautarem – mais uma vez – para cobrir uma das 103 áreas de risco de Fortaleza. Para quem não é da “Terra-do-sol”, estas áreas são locais catalogados pela prefeitura onde muito provavelmente – leia-se: constantemente! – podem acontecer inundações. E lá fomos nós para o bairro Quintino Cunha, ou melhor, para a periferia da periferia do bairro. Sem exageros, um dos locais mais sofridos que pude ver e cheirar. Sim, esses locais vêm carregados de imagens e cheiros ruins de verdade. Como disse no meu texto que foi ao ar, é difícil acreditar que pessoas possam viver em um ambiente como aquele. Eis aí a sociologia. Foi a primeira vez que fiz uma reportagem de botas tipo sete léguas. Era isso, ou quem sabe sair de lá com algum tipo de contaminação. É incrível como os moradores, incluindo velhos e crianças, andam despreocupadamente sobre a lama escura e mal cheirosa. Em lugares como o que eu e nossa equipe visitamos, muita coisa pode ser chamada de incrível. 
Nas entrevistas com as mulheres – os homens nunca estão. São elas que agüentam o peso maior tendo que cuidar da casa e dos filhos – ficou claro a dependência que comunidades carentes têm dos poderes públicos. Os apelos ainda são voltados para o emocional, para o “qui us pulíticus tenha pena de nois” . A resolução dos seus problemas ainda não passa pela obrigação dos governantes e legisladores, ou seja, pela razão na cobrança dos direitos civis. Mas é claro, seria pedir muito para quem mora com cinco, seis filhos, em uma barraco a pouquíssimos metros de um rio Maranguapinho cheio e nervoso com as últimas chuvas. Para o sustento, menos de um salário mínimo por mês. Eis a política social. 
É difícil crer que alguém possa terminar uma pauta como esta da mesma forma que começou. Se tiver algum colega que faça isso é por que já foi cooptado pelo sistema. E ainda nos pedem frieza e distância e ainda não se envolver emocionalmente com a matéria. Que seria dos imparciais? 
Ah, não pensem que esqueci do terceiro ensinamento: o teológico. Mas este é muito particular, é profundo demais. É um sentimento e experiência únicos. Só vivendo o momento e olhando nos olhos lamentosos de um povo sofrido para ensinar algo à nossa alma. 
Como diz o jornalista Ricardo Kotsho, “lugar de repórter é na rua”. 
Concordo.

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