segunda-feira, 1 de julho de 2013

BEIRANDO A LOUCURA... SERÁ?


Quando você estiver em uma redação, três e meia da tarde, depois de ter passado por quatro pautas, das oito ao meio dia...


Depois de ter chegado com uma fome louca e ainda ter que escrever as benditas pautas o mais rápido, antes que os editores façam de seus ouvidos uma zona de testes nucleares, com cobranças do tipo "Já terminou, já terminou... hém?" ou "Vamo, vamo, vamo que hoje ta tudo atrasado!" (para eles tudo está sempre atrasado)...
Diante de tudo isso, se você atender ao telefone dizendo, em vez de alô, "SONORA ?!" – como aconteceu certa vez comigo – não se espante, a loucura não te pegou, é apenas o cansaço mental, duro, aliás, de se vencer.

SEIS POR MEIA DÚZIA

Há décadas discute-se se o jornalismo chamado de literário é mesmo jornalismo ou literatura. Outra: crônica é jornalismo ou literatura? Bem, se eu for buscar tais assuntos... Mas o que me leva a publicar esta postagem são as minhas velhas e boas observações sobre o brilhante e - as vezes - obscuro bastidor do jornalismo a que tenho contato. A linguagem do telejornalismo também é um tema discutido exaustivamente por teóricos da comunicação e por aqueles que fazem telejornalismo. Venho observando, no entanto, que um excesso de cuidados - assim eu avalio - vem sendo dado no texto que vai ao ar. Percebo que determinados termos já vistos e ouvidos em grandes telejornais do país são execrados do dicionário televisivo local. O que denota é uma falta de crença do jornalista sobre o que o telespectador consegue assimilar. Talvez seja a velha mania da imprensa em achar que o seu público é ignorante demais para compreender determinadas palavras ou frases. A imprensa esquece que também pode e deve colaborar com a educação, o do ensino didático mesmo. Outra ocorrência comum é o repórter escrever seis e o editor corrigir para meia dúzia. Coisas de vaidade. Será?

"BOTA NO TEU BLOG!"

Nunca tive a mínima vontade de, ao me formar em jornalismo, trabalhar em uma emissora de televisão. Primeiro, sempre achei que o verdadeiro “fazer jornalismo” estava na mídia escrita. As cabeças pensantes da imprensa que eu conheci através das minhas extensas leituras sempre foram do jornalismo impresso: Alberto Dinis, Mino Carta e Joel Silveira, para citar os principais. A TV, com toda a sua força mercadológica, de convencimento e de poder de fogo frente à população, nunca me seduziu. Hoje, para quem me acompanha neste blog sabe que paguei minha língua, apesar de ainda acreditar que as cabeças mais privilegiadas da imprensa estão mesmo no impresso. Todo este rodeio é para dizer que hoje, no horário do almoço, se concretizou para mim, mais uma vez, que o jornalismo feito na TV é de profissionalismo e muita, muita vaidade também. A nossa editora chefe, com larga experiência na profissão, não deixou nenhuma dúvida: há vaidade em excesso no telejornalismo. Na verdade, disso eu nunca duvidei. Mas como eu estava na faculdade e não tinha a vivência da prática, poderia estar errado. Em uma reunião informal ficou claro como água que ainda vou enfrentar muitos colegas que não caminham, mas flutuam, donos de um ego inflado como um balão de gás. É a imagem em detrimento da informação. Aparecer bem na telinha nem que seja para falar alguns blá-blá-blás. Quem perde com isso? Todos. Os profissionais sérios, que acabam sendo comparados com os “bonecos” e “bonecas” de porcelana que omitem um dado importante da matéria mas não esquecem a prancha no cabelo. Sim, é claro que a TV é imagem e o repórter faz parte dela, mas o que se vê por aí é muita carinha bonita mas pouco conteúdo, ou, como sentencia Mino Carta: pouca crítica, nada de fiscalização do poder e muito menos a busca incessante pela verdade. O jornalista é um prestador de serviço. O telespectador – ou leitor, ou ouvinte – quer a informação para com ela modificar o seu mundo ou sentir-se parte dele, entendê-lo mesmo. E atrás dos rostinhos delicados ainda estão os apadrinhamentos, os nepotismos, as seduções extracurriculares, etc, etc. Mais uma vez: e quem perde com isso? E de novo respondo: eu, você, toda a categoria dos “guttenberguianos”, o mercado tantas vezes provinciano e principalmente o cidadão. Por isso, quem deseja ir com seriedade para o mundo do telejornalismo pode se preparar, pegue sua capa de chuva e venha para se molhar.


ps.: minha colega, jornalista Alexandra Souza, uma das participantes da reunião, disse, com o dedo em riste: “Bota isso tudo no seu blog!”

MAGIA EM MEIO AS PAUTAS


Sim, mágicas realmente acontecem em meio a pautas. Certa vez, para completar uma pauta que falava sobre previdência privada, me dirigi à Praça do Ferreira para completar a matéria com uma sonora. Como todos sabem, a praça é um reduto de senhores aposentados que se esparramam pelos largos bancos de madeira. Ótimo lugar para conseguir minha sonora final. Mas como descobrir uma boa sonora no meio de tantos senhores? Bem, aí é que entra a mágica da história. Como se houvesse uma seta invisível apontando na direção, fui puxar conversa exatamente com um aposentado do INSS que também possui uma aposentadoria privada. E com ele pude terminar minha matéria. Repito: em meio a um público de uns cinqüenta e tantas pessoas que ali estavam, fui escolher exatamente um que compunha perfeita mente a minha história. Sorte para o bom repórter. Essa não a primeira e – graças a Deus – nem foi a última. A mais recente foi justamente hoje.

A pauta não era a mesma, é claro. O assunto: legalização do aborto no Brasil. O local: Maternidade Escola Assis Chateaubriand. A personagem: uma mãe recente de dois bebês gêmeos; dois meninos. É claro que eu a abordei – mais uma vez – em meio a tantas outras que lá estavam com o intuito de ouvir uma resposta contrária à prática. Afinal estávamos em uma maternidade, sinônimo de vida. E foi exatamente isso que eu ouvi. Ela, com um dos filhos nos braços, apontou veementemente que abortar era uma loucura, mais, era um crime, um assassinato tirara a vida de uma criança. Até, tudo muito normal e esperado. Mas depois, em off, ela começa a relatar que aos 19 anos (no momento ela tinha 22), praticara um aborto tomando remédio em sua própria casa. Moral e magia da história: acabei me deparando com uma sonora onde a entrevistada recriminava um ato que outrora ela cometera. As mesmas respostas para a pergunta “você é a favor/você é contra” o aborto eu encontrei em uma mãe que esperava alta em meio a dezenas, centenas de outras daquele grande hospital. É Deus ajudando o bom repórter.
Depois, na ida para outra pauta, comentava comigo o cinegrafista. “O que é a vida?” Se a jovem mãe tinha optado em tirar a vida do primeiro filho (o feto tinha três meses) e agora havia tido dois bebês, é como se o que havia sido morto tivesse voltado juntamente com o irmãozinho. Uma espécie de compensação. Doce mistério!

PS.: os bebês serão batizados com os nomes de Renan e René. Saúde aos dois!

DESCOBRINDO O QUE JÁ NÃO É SEGREDO HÁ MUITO TEMPO



Quando saímos para as pautas geralmente sabemos quem vamos entrevistar. Mas há pessoas que não estão pautadas, mas são importantes para o contexto de nossa matéria jornalística. Em uma audiência pública que cobri no dia de hoje, havia as pessoas que eu obrigatoriamente deveria entrevistar, mas por lá encontrei personagens interessantes para dinamizar a minha matéria. Antes, devo acrescentar algo que o pensamento popular já sabe de cor. Algumas situações ainda permanecem enraizadas em nosso comportamento, principalmente da classe política de nosso país. O favorecimento familiar, por exemplo. Nesta audiência, qual foi minha surpresa quando descobrir, depois da entrevista que fiz que a presidência de um dos mais importantes complexos culturais do nosso Estado é exercida por um parente de primeiríssimo grau de um dos políticos mais conhecidos do Ceará. Como seu partido é de situação, não deve ter sido muito difícil ter conseguido um cargo na atual administração para o parente.
Conversando este assunto com um editor experiente de telejornal, que já viu muitos casos de favorecimento político em seus vinte e tantos anos de TV, chegamos à seguinte pergunta: como os legisladores podem criar leis que eles mesmos não conseguem cumprir? Talvez seja por isso que nesta mesma semana milhares de cearenses tiveram os títulos eleitorais cancelados pela justiça por não terem comparecido às três últimas eleições. Na matéria que fiz sobre esses cancelamentos, muitos eleitores me perguntavam: "votar pra quê, seu repórter?".

IMPRENSA QUE APRENDE E APREENDE


As reportagens políticas, nos telejornais, provavelmente são os momentos em que o telespectador mais se remexe na cadeira da sala. Não preciso explicar o porquê, é claro. Interessante é quando nos deparamos com algo parecido, no dia-a-dia das pautas.
Sabemos que a imprensa, desde que se ligou ao poder, padece do malefício de servir a este mesmo poder. Saber na teoria é uma coisa, mas quando você vê e ouve in loco a imprensa se curvando a interesses pessoais ou familiares de um ou de outro político ou empresário, a percepção que se tem é que a imprensa também colabora para a deturpação de sua própria imagem.


Fazer cobertura jornalística travestida de publicidade onde a vítima é o povo, é intragável. Se uma emissora de TV comercial faz este tipo de barganha, imagine você uma TV estatal como as legislativas dos Estados e Municípios deste país. Será que podemos realmente confiar no material crítico produzido por elas? De Brasília ao menor dos municípios, da futura TV digital à emissora de rádio de qualquer confim, será que é possível um trabalho de reportagem realmente sem o cheiro da vaidade, da cobiça, do vanglorismo dos donos do poder? O jornalista e fazedor de revistas Mino Carta, certa vez afirmou que as três colunas do bom jornalismo são: manter o pensamento crítico afiado, buscar incessantemente o que há de verdade nos fatos e fiscalizar caninamente os poderes.



Cabe ao repórter estar constantemente atualizando estas vacinas. A mosca azul do poder constantemente nos ronda. Tais práticas tão comuns em nada contribuem para a melhoria de nossa profissão, de nossa cidadania e, é claro, de nosso país.

FÁBRICA DE PARAFUSOS

Cada vez mais eu acredito que o poder do sistema pode transformar pessoas. “Conhecereis as árvores pelos seus frutos”, filosofou certa vez, o Filho do Homem. E é desses frutos que falo. Observo que profissionais de imprensa tarimbados no mercado, com muitos anos de redação – e aí falo do telejornalismo – vivem num mundo paralelo. Depois de anos bombardeados pela correria dos fechamentos de um, dois, três programas jornalísticos; depois de anos vivendo sob a pressão do tempo, de uma matéria que “cai”, de uma edição em cima da hora ou coisas do tipo, tudo isso faz com que estes profissionais, depois de anos trabalhando nesse ritmo, acabem se deixando engolir por uma velocidade irreal, por problemas que só existem nesse mundo paralelo. Decisões que devem ser tomadas no calor dos fatos, um “ao vivo” que não sai, uma pauta que não se completa, são situações que alimentam e tornam a alimentar as mentes, que hoje, são prisioneiras da vertiginosa corrida para não se sabe onde. Mais pontos no Ibop? Mais patrocínios? Agradar interesses pessoais? Mais pautas com menos repórteres e em menos tempo? E a qualidade? E o produto final que será captado pelo telespectador que, reza a teoria, deveríamos informar, e bem? 
Um dos sentimentos que reconheci quando escrevi minhas primeiras matérias foi a frustração. Ele, o sentimento, chega ao exato momento que sai a qualidade para dar lugar à quantidade. Podemos comparar isto com uma fábrica que produz parafusos. Todos iguais, eles saem aos milhares ao simples apertar de um botão ou o puxar de uma alavanca. O tal sistema a que me referi na primeira linha deste texto, é esta fábrica. O sistema ordena que se produzam pautas aos milhares, em cada vez menos tempo, cada vez mais parecidas. E nesta tempestade ininterrupta, os profissionais tarimbados fazem o papel da mão que de tempos em tempo, em meio a relâmpagos e trovoadas, devem acionar a alavanca da prensa produtora de pautas. Muitos deles fazem isso sem o saber, já foram lobotomizados pelo corre-corre das redações. Não conseguem mais olhar para os lados.